A família aborda várias questões, mas eu aqui pretendo, duma forma prática
e necessária, incidir sobre a acção de Alimentos devidos à menores,
porque julgo que é uma questão primordial no contexto actual em Moçambique e
para que mesmo você que tem filho e que não entenda nada de leis possa
reivindicar os direitos do teu filho. Pois, hoje, sem muito esforço, observamos
muitas crianças abandonadas pelos seus progenitores e vezes, sem conta, o
pai/mãe era quem acarretava com as despesas de casa. Porém, a determinada
altura, não importa a razão, este/esta decide abandonar o lar, deixando os
menores carecendo de alimentos.
Quando falamos de alimentos, conforme estatui a lei supra, no seu artigo
407, entende-se ser "tudo o que é indispensável à satisfação das
necessidades da vida do alimentado, designadamente, ao seu sustento, habitação,
vestuário, saúde e lazer".
Como vêem, é um erro jurídico pensar que falar de alimento é falar apenas
de comida. Não, falamos de um conjunto de coisas que é essencial e imprescindível
para a vida, neste caso, do menor. O alimento é uma noção englobante, que
envolve também a questão da educação e demais elementos primários e não só para
o contínuo desenvolvimento (físico e psicológico) do alimentado.
Uma coisa que se deve ter em conta nesta situação, é que estes alimentos devem ser proporcionais aos meios daquele que os tiver de prestar e às necessidades do que houver de receber, portanto... O representante legal do menor (o pai/mãe), na propositura da acção deve ter em mente este aspecto, para que possa pedir segundo as necessidades concretas do menor, respeitando, como é óbvio, as possibilidades do que tiver de dar essa pensão. Pois, não pode um pai que tem um ordenado mensal de 2500,00 Meticais ser obrigado a prestar uma pensão no valor de 5000,00Mt, conforme se dispõe no artigo 408, do mesmo dispositivo legal (Lei 10/2004, de 25 de Agosto).
Aliás, é preciso deixar claro que dos rendimentos do obrigado o juiz fixará
uma pensão nunca superior a 1/3, podendo, se ponderada situação justificar, fixar
a baixo disso.
Um outro aspecto, não menos interessante, é que o juiz fixará essa pensão
mensal em dinheiro segundo o artigo 409. Entretanto, por se tratar de um
direito civil, com o carácter eminentemente social, podem as partes, como é
típico deste tipo de jurisdição, a qual denominamos voluntaria, acordarem que
as pensões sejam prestadas de forma diversa e não em dinheiro, desde que a tal pretensão
cubra de facto o interesse superior do menor, pois antes da homologação do juiz
por sentença, o acordo é passível de apreciação do curador de menores, que é a
entidade estadual (Ministério Público) que zela pelos interesses dos menores.
Vou agora abordar um aspecto da prática quotidiana, muito importante,
porque sinto que, vezes sem conta, as pessoas perdem alguns direito por
desconhecimento da Lei.
A Lei dispõe que a pensão de alimentos é devida ao menor desde a
propositura da acção, o que equivale dizer que a mesma, depois de fixada, deve
ser prestada desde a abertura do processo, conforme dispõe o artigo 410. Em
outras palavras, estamos a dizer o seguinte: se eu fosse a abrir um processo
contra a minha esposa, no dia 15 de Abril de 2010 e o mesmo viesse a findar
favorável em 6 de Outubro do mesmo ano, caso o juiz não decrete a
retroactividade, devo lembrá-lo, por requerimento, que os alimentos são devidos
desde a propositura (entrada da petição inicial). Ai, eu não só irei receber a
pensão do mês de Outubro (data da sentença) em diante, mas também receberei
retroactivamente a pensão de Abril, Maio, Junho, Agosto, Outubro e de
seguintes meses, até a sua alteração...
Ademais, o artigo 416 do supramencionado diploma legal, prevê questão da
alteração da pensão alimentar, o que quer dizer que a pensão pode ser revista
ou alterada a qualquer momento ou anualmente, desde que as circunstâncias que a
determinaram se tenham modificadas. Essa alteração não significa necessariamente
o aumento anual como habitualmente ocorrem os reajustes salariais, pois também pode
incluir a sua redução.
Por exemplo: pelo reajuste salarial pode ocorrer o aumento da pensão.
Ainda, se o pai que presta a pensão é promovido na empresa ou obtêm um emprego
melhor. E se o inverso ocorrer pode o obrigado requerer a sua redução,
fundando-se, como é óbvio, no facto de as circunstâncias que influenciaram
aquela sentença se ter alterado como a perda de emprego ou surgimento de novos
dependentes.
Entretanto, é incrível como as coisas ocorrem habitualmente, o obrigado
sempre procura intentar uma acção para redução, forjando por vezes artifícios,
e, o que tem a guarda do menor, intenta outra para o aumento da pensão.
Isto não ocorre oficiosamente, devem as partes interessadas voltar sempre que
convier ao tribunal.
Contudo, somos de opinião que o acordo entre as partes quanto à esta matéria
é o melhor caminho que se pode trilhar. Diz um vetusto adágio, mais vale um mau
acordo do que uma boa demanda. Esse acordo pode ser reduzido à escrito,
reconhecido as assinaturas no notário e depois submetido à juízo para a sua homologação
em sentença para que produza facilmente todos efeitos de direito.
Fases da Acção de Alimentos devidos à Menores.
No tribunal de Menores da Cidade de Maputo não há Preparo
Inicial, pagam-se as custas judiciais no final do processo, geralmente paga
aquele que for condenado (obrigado) ao pagamento da pensão, mas tudo fica ao critério
do juiz em consonância com o C.C.J.
A tramitação deste tipo de processo segue o estatuído no
artigo 128 e seguintes, da Lei 8/2008 de 15 de Julho (Lei da Organização
Tutelar de Menores) em conjugação com o C.P.C, em tudo quanto seja omisso
naquele:
1ª - Entrada da petição ou requerimento (na Secretaria Geral);
2ª - Distribuição (para que o seu documento possa ir à uma Secção onde irá
correr até a sentença. Lá o seu documento será autuado, ganhando a forma de um
processo com o seu respectivo número de identificação, que lhe será fornecido
na secção)
3ª - Na secção o Juiz ordenará que seja citado (vulgo intimar) a outra
parte para tomar conhecimento de que corre contra ele/ela uma acção
judicial (na citação este/esta receberá a cópia do requerimento inicial e uma
nota legal e assinará uma certidão que confirma que tomou conhecimento da
acção e querendo, poderá contestar a P.I dentro do prazo de cinco dias.
4ª - Para contestar terá o Apelado/a (requerido ou requerida) um prazo de
cinco dias, que lhe será indicado o termo pelo oficial de diligências.
No mesmo despacho ordenará ainda:
- Que se oficie as instituições de trabalho dos apelados para o envio ao
tribunal das declarações de vencimento e demais subsídios auferidos pelos
mesmos (se ambos trabalham).
- Que impenda sobre os dois um inquérito social, para in loco apurar as
condições reais, económicas e sociais dos apelados, que terá lugar no
próprio tribunal e posteriormente o agente da assistência social fará visitas a
residência de cada um dos progenitores (art. 56,LOTM). Para no fim produzir um
relatório os próprios autos, para orientar o juiz no que for que seja, para a
tomada de decisão. Alias, na cúria, com informação tomamos a melhor decisão.
5ª - Realizadas as diligências acima descritas, o Juiz ordenará que o
processo vá com vista ao curador de menores, para que este por seu turno, possa
observar as questões de legalidade, do interesse dos menores e até propor a
fixação da pensão.
6ª - Por último, o juiz, observando todas as formalidades legais, poderá
convocar as partes para um julgamento, em caso de necessidade de produção de
mais provas, sempre precedida a audiência de uma tentativa de conciliação
(acordo quanto ao litigio) para só depois, fixar a sentença.
Geralmente os interessados estão preocupados com o tempo que este tipo de
processo leva para chagar o fim. O que podemos adiantar, da nossa humilde
experiencia forense, é que não existe um tempo exacto que se garanta, pois
depende de vários factores, uns processuais e outros acidentais. Todavia,
podemos adiantar ainda que corramos algum risco de errarmos, que o mesmo pode
levar, mais ou menos, caso em que não haja acordo entre as partes, 3 meses e,
se o acordo vier a qualquer momento poderá o processo terminar na fase em que
se encontrar...
Bem, importa salientar que estamos a falar apenas de processos cujos interessados
residam e trabalham na Cidade Maputo.
N.B: é preciso salientar que a consequência do não pagamento da pensão alimentar
dá direito à cadeia, neste caso a submissão ao foro criminal, conforme dispõe o
artigo 131 da LOTM.
Esboço de Petição Inicial para Prestação de pensão de
Alimentos
Tratando-se de jurisdição de menores orienta-se pelo princípio de bom senso
e equidade e não sujeito a critérios de legalidade estrita, o legislador
entendeu que estas petições devem obedecer a forma de processo mais simples que
houver (processo sumário). Aliás, até pode o juiz receber o pedido escrito em
forma de um requerimento (sem articulados), desde que as partes sejam muito bem
identificadas, exista um nexo de causalidade entre o pedido e a causa de pedir,
legitimidade, competência territorial (ou seja se menor resida na Cidade de
Maputo, é competente o da Cidade de Maputo para conhecer do mérito da causa,
assim sucessivamente), etc.
Não é obrigatório neste tipo de processo a presença de advogado, conforme artigo
91 da LOTM, salvo em caso de recurso, uma vez que o processo sobe para o
tribunal superior (ad quem).
um esboço simples de como você pode se dirigir a um juiz, para que o
tribunal possa atender o seu pedido:
Meritíssimo Dr. Juiz do Tribunal de Menores da Cidade de
Maputo.
Maputo
Mário Alexandre, de nacionalidade moçambicana, solteiro,
doravante designado por Requerente, residente no Bairro da Malhangalene, Av. da
Resistência, 3º andar, flat 3, direito, nº 1418, com domicílio
profissional na Empresa Águas de Maputo, como Técnico de Contas, pai do menor
Hélio Alexandre, conforme atesta o doc. 1, em anexo, vem intentar
Contra:
Fabiana Titos, também de nacionalidade moçambicana, casada,
doravante designada por Requerida, residente no Bairro de Xipamanine, Av. Irmão
Rubi, casa nº 38, uma vivenda, Q. 19, próximo da Casa dos Pães, com domicílio
profissional na Empresa Vodacom, mãe do menor já identificado:
Uma acção declarativa de condenação de Alimentos, fundando-se e louvando-se
nos factos seguintes:
I
O Requerido e a Requerida residiram em união de facto durante 5 anos, e
dessa relação nasceu o menor acima identificado, hoje com 4 anos de idade,
frequentando o último ano da creche, onde paga uma mensalidade no valor de
6.000,00Mt, conforme atesta o doc.2.
II
Apesar de o requerente possuir a aguarda do filho, um trabalho fixo e um
rendimento mensal, não obsta que a requerida se exima das suas obrigações
primárias, que são de prover alimentos, nos termos do disposto no artigo 407,
da Lei 10/2004, de 25 de Agosto, até porque este acarreta com as despesas de
arrendamento e alimentação, é estudante do ensino superior numa escola privada,
onde paga 7000,00Mt mensais, (vide doc. 3 e 4) e paga a babá do menor,
entre outras despesas correntes.
III
Ademais, importa realçar que a requerida é, para além de trabalhadora da
empresa acima referenciada, onde aufere um salário condigno, proprietária de um
estabelecimento comercial (restaurante), de muito sucesso na Praça, sita na Av.
24 de Julho, nº 2015, de nome Jantar à Moçambicano.
IV
Todavia, apesar de possuir recursos mais do que suficientes para prover uma
pensão alimentícia ao seu filho, nos termos do artigo 408, tem esta se
recusado com veemência, fazendo com que o menor careça de Vestuário como
uniforme escolar e de lazer, material escolar e alimentação variável e
saudável, transporte escolar, etc.
Diante do exposto, requer a V. Exa, que seja a requerida condenada no
pagamento de uma Pensão mensal, no valor de 15.000,00Mt.
Maputo, 15 de Fevereiro de 2011
Junta: duplicados
legais – 3 cópias, fotópias da cédula da criança autentica.
E ainda reconhecer
o documento no notário.